domingo, 28 de agosto de 2011

Carlos Gomes - Um extraordinário guarda-redes com uma carreira atribulada!

Carlos Gomes com 20 anos já titular da baliza leonina, sucedendo a Azevedo.
(Separata da revista "Mundo de Aventuras", 1952)

A propósito da recente contratação de Carlos Martins e de Jorge Ribeiro por parte do clube espanhol Granada, recém promovido à 1ª Liga de Espanha, o Armazém Leonino recorda hoje uma outra transferência de um jogador português para este clube espanhol, precisamente o grande e inesquecível guarda-redes leonino Carlos Gomes (18/1/1932-17/10/2005), cuja vida atribulada e acidentada, dentro e fora dos relvados, teria dado certamente um bom filme!
No final da época de 1957/58, após se ter sagrado, pela 5ª vez, campeão nacional pelos "leões", Carlos Gomes, então com 26 anos, abandona o clube leonino descontente e em desacordo relativamente ao baixo ordenado que recebia no Sporting. Após um longo e intenso "braço-de-ferro" com os dirigentes leoninos e não tendo sido possível ultrapassar as profundas divergências financeiras, Carlos Gomes acaba por se transferir para o futebol espanhol, mais concretamente para o Granada (treinado por um antigo técnico leonino, o argentino Alejandro Scopelli), onde veio a auferir uma remuneração oito (!) vezes superior à que tinha no Sporting.

Chegava assim ao fim a carreira de Carlos Gomes em Alvalade, após 8 temporadas (entre 1950/51 e 1957/58) em que conquistara 5 campeonatos nacionais (4 deles consecutivos) e uma Taça de Portugal (1953/54), sendo ainda finalista vencido desta prova por mais duas vezes (1951/52 e 1954/55). Durante o período de tempo em que permaneceu ao serviço do Sporting, Carlos Gomes não só conquistou títulos e honrarias, mas igualmente acumulou multas e suspensões fruto do seu temperamento rebelde, conflituoso e irreverente.

Carlos Gomes era um guarda-redes dotado de extraordinárias qualidades físicas e técnicas e com uma vocação fabulosa para o lugar, sendo aquilo a que se pode chamar um predestinado das balizas. Para além de possuir uma grande elasticidade e reflexos entre os postes, revelava igualmente uma enorme coragem e eficácia nas saídas da baliza, quer aos cruzamentos, quer aos pés dos adversários. Na verdade, Carlos Gomes foi um dos maiores guarda-redes que passaram pelo futebol português até hoje, sendo a par de Azevedo e Damas, um dos melhores guarda-redes leoninos de sempre.

É de lamentar a frequência e a quantidade de situações e de problemas, dentro e fora dos relvados, com que Carlos Gomes se teve de debater, os quais ensombraram e prejudicaram grandemente a sua carreira desportiva, pois estamos em crer que o guarda-redes leonino poderia ter realizado uma carreira fabulosa no futebol português. Condições físicas e técnicas para tal não lhe faltavam, faltando-lhe sim, maior ponderação, equilíbrio emocional e estabilidade psicológica para lidar com a pressão, sobretudo fora dos relvados.
Durante a sua permanência no Sporting e em Portugal, Carlos Gomes viu-se, por diversas vezes, a contas com a PIDE, devido às suas posições sociais e políticas contrárias ao regime fascista vigente em Portugal, mostrando um apurado sentido crítico e manifestando grandes dificuldades em conviver com esse regime de opressão e de censura (falta de liberdade de expressão e de opinião) que então se vivia no país.
Depois de uma época ao serviço do Granada, Carlos Gomes transferiu-se para o Oviedo, regressando a Portugal e ao Sporting, em 1961. Como as divergências contratuais com os dirigentes leoninos teimavam em manter-se, Carlos Gomes ingressou no Atlético, mas por pouco tempo, pois logo a seguir voltou a meter-se em sarilhos (foi condenado a 11 anos de prisão), tendo de fugir do país e exilando-se no estrangeiro durante mais de 20 anos, primeiro em Espanha e depois no Norte de África (Marrocos, Argélia e Tunísia). Regressaria a Portugal apenas em 1983, vindo a falecer em 2005, com 73 anos.
A carreira e a vida de Carlos Gomes mereceriam, de facto, uma reflexão e uma análise mais profundas, dada a complexidade do seu carácter e personalidade, por um lado, e da própria conjuntura e vicissitudes da época em que viveu, por outro. Não quero terminar este artigo sem deixar, no entanto, uma breve consideração pessoal a respeito do que poderia ter sido a carreira de Carlos Gomes e até onde este poderia ter chegado, caso este extraordinário guarda-redes tivesse permanecido no Sporting.
Em 1958, quando abandonou o clube leonino, Carlos Gomes tinha apenas 26 anos, tendo realizado 221 jogos em 8 temporadas (média de quase 28 jogos por época) com a camisola leonina. Por outro lado, Carlos Gomes era o guarda-redes titular indiscutível da Selecção Nacional, totalizando 18 internacionalizações (entre Novembro de 1953 e Maio de 1958). Estamos, pois, em crer que noutras circunstâncias, caso não tivesse estado envolvido em problemas de vária ordem, quer com o seu clube, quer com o regime político do seu país, Carlos Gomes poderia perfeitamente, dadas as suas extraordinárias capacidades, ter continuado como titular do Sporting e da Selecção Nacional por mais 7 ou 8 anos e, quem sabe, até poderia ter participado no Campeonato Mundial de Futebol em Inglaterra, pois em 1966 teria 34 anos, mais novo até do que José Pereira, titular da baliza dos "magriços". Quem sabe até se com Carlos Gomes na baliza, Portugal não poderia ter sido campeão do mundo!
É claro que tudo isto não passam de meras suposições que logicamente nunca puderam nem poderão vir a ser comprovadas, mas não resisto a fazê-las, pois tenho a firme convicção de que Carlos Gomes passou, como é comum dizer-se, ao lado de uma grande carreira no futebol português e, em particular, no Sporting, pois se em 8 anos de carreira em Portugal muito conquistou, muito mais poderia ter conquistado em outros tantos anos.
Na verdade, a História da carreira desportiva de Carlos Gomes nunca deixou de me intrigar e de estar presente nas minhas reflexões e pensamentos sobre o futebol português e, em particular, sobre o Sporting, pois sinto, como sportinguista, uma profunda mágoa, para não dizer revolta, deste fantástico guarda-redes, dos melhores de sempre do futebol português, não ter chegado mais longe na sua carreira, como as suas enormes qualidades faziam prever. Foi uma pena! Ficou a perder o atleta, o Sporting e o futebol português!

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Salvador

A História do futebol português é fértil em exemplos de futebolistas que tendo atingido grande destaque e notoriedade ao serviço de clubes de menor dimensão (comparativamente com os chamados "três grandes"), quando porém ingressaram no Sporting, F.C. Porto ou Benfica tiveram um desempenho modesto e um rendimento abaixo das expectativas, não conseguindo afirmar-se como titulares nos respectivos clubes.
Assim de repente e ao correr da memória recordo-me perfeitamente de 5 jogadores da década de 70, curiosamente todos do Boavista, que quando se transferiram para os "três grandes" não conseguiram mostrar todo o seu potencial nem manter o rendimento futebolístico anteriormente evidenciado. Tal foram os casos, por exemplo, dos avançados Jorge Gomes e Folha no Benfica, de Albertino e Júlio no F.C. Porto e de Salvador no Sporting. É precisamente sobre este último jogador que incide o presente artigo, uma vez que foi este avançado brasileiro que jogou no Sporting na época de 1980/81.
Salvador Luis de Almeida nasceu no Rio de Janeiro a 7 de Agosto de 1949, tendo chegado a Portugal com 23 anos, no início da época de 1972/73, para jogar no Boavista. Salvador permaneceu 8 épocas ao serviço dos axadrezados, até ao final da temporada de 1979/80, tendo durante este período conquistado 3 Taças de Portugal (1974/75, 1975/76, 1978/79) e uma Supertaça (1978/79).
Viviam-se então os tempos áureos do Boavista, conhecido justamente por "Boavistão", fruto da grande equipa então treinada e orientada no banco pelo mestre José Maria Pedroto e comandada no campo pelo "maestro" João Alves. Foi este "Boavistão" que conquistou as duas primeiras Taças de Portugal do clube axadrezado e alcançou o 2º lugar no Campeonato Nacional da época de 1975/76, com menos 2 pontos que o campeão nacional, o Benfica.
Salvador assumiu-se desde logo como um dos elementos de maior destaque dessas grandes equipas axadrexadas, fazendo sobressair as suas qualidades técnicas e físicas na frente de ataque dos boavisteiros, actuando preferencialmente pelo lado esquerdo. Salvador era um avançado bem constituído fisicamente, baixo mas entroncado, rápido e com boa técnica, dotado de um bom pé esquerdo e de um forte remate.

Caricatura de Salvador da autoria do mestre Francisco Zambujal
(caderneta "Arte e Futebol", época 1979/80).

Salvador foi o herói da primeira final da Taça de Portugal ganha, em 1974/75, pelo Boavista, ao apontar os 2 golos com que os axadrexados venceram (2-1) o Vitória Sport Clube (Guimarães). Ao serviço do Boavista viria a conquistar mais duas Taças de Portugal, frente ao Benfica (vitória 2-1), em 1975/76, e frente ao Sporting (vitória 1-0, na finalíssima), em 1978/79.
Ao fim de 8 épocas no Bessa e fruto das boas temporadas e exibições ali realizadas, Salvador foi alvo do interesse do Sporting que acabou por contratá-lo no início da época de 1980/81. Ao serviço do clube leonino, Salvador acabou por realizar uma época modesta, muito aquém das expectativas criadas em torno de si, não conseguindo afirmar-se como titular indiscutível dos "leões".

Com a camisola leonina, Salvador realizou apenas 17 jogos, 14 dos quais a contar para o Campeonato Nacional, não tendo marcado qualquer golo. O avançado brasileiro estreou-se de "leão ao peito" a 31 de Agosto de 1980, em jogo realizado no Estádio do Fontelo, em Viseu, a contar para a 2ª jornada do Campeonato Nacional, frente ao Académico de Viseu, tendo a partida terminado empatada (1-1).
Salvador acabou por ser "vítima" da forte concorrência então existente no sector atacante dos "leões", bem servido de jogadores como Manuel Fernandes, Manoel, Jordão, Lito e Freire e, de certa forma, o seu rendimento também se ressentiu da fraca prestação da própria equipa leonina ao longo da época, a qual terminou o campeonato num modesto 3º lugar.

Equipa leonina da época de 1980/81.
Em cima (da esquerda para a direita): Eurico, Jordão, Bastos, Inácio e Vaz.
Em baixo (mesma ordem): Ademar, Manoel, Marinho, Barão, Manuel Fernandes e Salvador.

No final da época de 1980/81, Salvador, então com 32 anos, abandonou o Sporting ingressando no Sporting de Espinho, ao serviço do qual ainda jogou durante 3 temporadas, até à época de 1983/84, finda a qual deu por terminada uma bonita carreira de 12 anos em Portugal, regressando então ao seu país natal, o Brasil.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Sporting na 57ª edição do Torneio Ramón de Carranza 2011.

O belo e imponente troféu Ramón de Carranza.

Precisamente 25 anos depois da sua primeira participação, o Sporting voltou a merecer a honra de ser uma das equipas convidadas a participar no Torneio Ramón de Carranza, famoso torneio espanhol de pré-época que se realiza todos os anos em Cádiz, uma bonita cidade portuária do sul de Espanha (província da Andaluzia).
Este ano realiza-se a 57ª edição deste prestigiado torneio quadrangular de verão que deve o seu nome precisamente a um ex-presidente do Cádiz CF.


Este torneio juntamente com o Teresa Herrera (na Corunha) são considerados os mais importantes torneios espanhóis de pré-época e, inclusivamente, são considerados dos mais famosos da Europa. O Torneio Teresa Hererra já o Sporting conquistou em 1961 (ler aqui). Que bonito seria conquistar 50 anos depois o Torneio Ramón de Carranza! E que bem ficaria este lindo e grandioso troféu no Museu do Sporting!
O Torneio Ramón de Carranza é disputado por 4 equipas, o anfitrião Cádiz CF e 3 equipas convidadas, que este ano são justamente o Sporting, o Málaga (Espanha) e a Udinese (Itália). O torneio vai ter lugar nos dias 5, 6 e 7 de Agosto, tendo o sorteio ditado os seguintes jogos das meias-finais: Sporting / Málaga e Cádiz CF / Udinese, no dia 5 de Agosto. Os vencidos destes 2 jogos disputarão os 3º e 4º lugares no dia seguinte, sendo que a final se realiza no último dia do torneio (7 de Agosto) entre os vencedores das meias-finais.
A primeira edição deste emblemático torneio realizou-se em 1955, tendo tido como vencedor o Sevilha FC. Até hoje participaram neste torneio 5 equipas portuguesas: o Benfica - que esteve já presente em 5 edições - venceu o troféu por duas vezes (1963 e 1971); o Atlético Clube de Portugal, o Belenenses, o Sporting de Braga e o Sporting estiveram presentes apenas numa única ocasião. O Atlético de Madrid é o clube com mais vitórias neste torneio, com 8 troféus, seguido do clube da casa, o Cádiz CF, com 7 troféus conquistados.
O Sporting repete, assim, este ano a participação de 1986, ano em que teve uma estreia infeliz ficando classificado no 4º e último lugar, atrás do Cádiz FC (vencedor), Real Bétis (Espanha) e Botafogo FR (Brasil).
No jogo das meias-finais, disputado a 23 de Agosto, o Sporting foi derrotado pelo Real Betis, por 2-0 e no jogo de atribuição dos 3º e 4º lugares, realizado no dia seguinte, voltou a ser derrotado, desta vez por 1-0, diante do Botafogo FR.
A título de curiosidade, recordamos a constituição da equipa leonina que se estreou neste torneio há 25 anos: Damas; Gabriel, Venâncio, Morato e Fernando Mendes; Zinho, Oceano, Negrete e Mário; Manuel Fernandes e Meade.
Apresentamos, a seguir, a foto de uma das equipas-tipo do Sporting dessa época de 1986/87, a qual só difere da constituição da equipa acima indicada em 2 jogadores: Virgílio em vez de Gabriel e Litos em vez de Mário.

Em cima (da esquerda para a direita): Venâncio, Oceano, Virgílio, Meade, Morato e Damas.
Em baixo (mesma ordem): Zinho, Manuel Fernandes (cap.), Negrete, Fernando Mendes e Litos.

O Armazém Leonino faz votos para que, na sua segunda participação neste prestigiado torneio espanhol, o Sporting consiga deixar uma melhor imagem do seu real valor e dê mostras de todo o seu potencial futebolístico, pois jogadores de categoria não faltam no plantel leonino. Há que ter um pouco de paciência e dar tempo ao tempo, pois o Sporting sofreu uma grande remodelação e renovação no seu plantel, tendo entrado praticamente uma equipa nova, na qual se incluem jovens promessas que podem vir a dar muito que falar.
Com efeito, metade do plantel é novo e, como tal, uma equipa não se constrói de um dia para o outro, mas existem muitas opções de qualidade às ordens do treinador Domingos, o qual dispõe de, pelo menos, dois jogadores para cada posição. O técnico leonino saberá, certamente, tirar o maior partido das potencialidades de cada jogador, escolhendo a posição do terreno onde cada um poderá render melhor.
Na verdade, caso se concretize a contratação de Jeffrén e se confirme a inclusão de Abel (após recuperar da operação) no plantel, Domingos passará a contar com 30 (!) jogadores* ou 28 (caso se opte pelo empréstimo dos defesas João Gonçalves e Tiago Llori). Existem, portanto, jogadores em quantidade e qualidade mais do que suficientes para assegurarem uma época de sucesso para o emblema do "leão" ou, pelo menos, que oferecem garantias do Sporting poder lutar até ao fim pela conquista de todas as competições em que vai estar envolvido: Campeonato Nacional, Taça de Portugal, Taça da Liga e Liga Europa.
Acima de tudo, é preciso acreditar na competência já demonstrada por Domingos Paciência e na qualidade deste plantel que é bastante equilibrado nos seus vários sectores, permitindo acalentar esperanças numa excelente época. Para isso todos somos poucos para apoiar e incentivar o nosso Sporting, à semelhança daquilo que fizeram os quase 50 000 espectadores que estiveram presentes em Alvalade, no passado dia 30 de Julho. Força Sporting, estamos contigo! Boa sorte para o Torneio Ramón Carranza!

* GUARDA-REDES (3): Rui Patrício, Marcelo Boeck e Tiago; DEFESAS (11): Abel (?), João Pereira, Carriço, Polga, Rodriguez, Onyewu, Arias, João Gonçalves (?), Tiago Llori (?), Evaldo e Turan; MÉDIOS (10): Schaars, Izmailov, Diego Capel, Matias Fernández, Fabián Rinaudo, Luis Aguiar, Pereirinha, André Santos, André Martins, Carrillo; AVANÇADOS (6): Bojinov, Wolfswinkel, Yannick Djaló, Hélder Postiga, Diego Rubio e Jeffrén (?).